sábado, 31 de maio de 2025

Julio Renner: Um pouco da história do Frigorifico Renner

 


Autor: Vera Lucia Renner

Ano de 2025

O ano era de 1896 no Vale do Caí quando meu bisavô descendente de alemães,  Jacob Renner, fundou a Refinaria de Banha Rosa produto que era utilizado na cozinha e no preparo de muitos alimentos como sendo o principal. Meu avô Julio Renner herdeiro do complexo industrial expandiu o negócio transformando a então refinaria no Frigorifico Renner. Com um corpo de funcionários expressivo da cidade e prestação de serviços da região, alcançou uma produção relevante em mateira de produtos oriundos do abate de gado bovino e de suínos.

Meu pai, Julio Gaspar Renner assumiu o comando da empresa e na sequência meu irmão Júlio Alfredo Renner. O negócio expandiu com velocidade galgando uma expansão internacional que necessitou de grandes investimentos para ajustar a qualidade que a exportação dos produtos exigia. Ocorreu uma instabilidade no mercado internacional levando a empresa à dificuldades financeiras ocasionando a decretação da falência em janeiro de 1980. A massa falida foi leiloada e adquirida pela Coopave de Lajeado que também teve problemas e na sequência fechou as portas.


Gente da Terra

 




Crédito "Canal Youtube Ralp Vida & Esperança"

https://www.youtube.com/@RalpVidaEsperanca







Jacob Renner casou com Clara Fetter

A família morava em Alto Feliz. Eles possuíam uma fábrica de banha que Jacob tratou de transferir para a cidade de Carlos Barbosa em 1908, já prevendo a inauguração da estrada de ferro que ligava Porto Alegre a Caxias do Sul.

Em 1917 Jacob mudou sua fábrica para Montenegro. É a mesma fábrica que, posteriormente, foi liderada por seu irmão Júlio Renner e que veio a se transformar no Frigorífico Renner , um dos maiores produtores de fiambres do Brasil.






Casa Renner

 


Casa da Família Renner em Montenegro

A casa da Familia Renner é datada de 1900 e está instalada até hoje na Rua Capitão Cruz 1381, possuindo um estilo clássico das casas de época. Nos dias de hoje a Familia de Julio Alfredo Renner e Maria Fernanda D’Almeida Renner residem no endereço.

Refinaria de Banha Rosa J. Renner & Cia.

 


Em 1908 Jacob Renner tinha sob sua direção uma fábrica de banha situada em Carlos Barbosa na serra gaúcha. Com a proximidade de inauguração da estrada de ferro que ligaria Porto Alegre a Caxias do Sul Jacob, em 1917,  decidiu transferir o complexo industrial para a cidade de Montenegro. Anos após a mesma fábrica foi liderada por seu irmão Júlio Renner  que veio a se transformar no Frigorífico Renner, um dos maiores produtores de fiambres do estado.

Julio Renner e Araci Leite Renner


 

Julio Gaspar Renner e Vera Renner

 


Julio Alfredo Renner e Maria Fernanda D’Almeida Renner

 


O Tropeiro

 



As granjas ao redor da cidade de Montenegro forneciam a matéria prima para fabricar a famosa Banha Rosa e os embutidos e fiambres que provinham da carne suína. Atravessavam a cidade até a chegada do imenso prédio icônico   erguido na beira do rio Caí, no Porto das Laranjeiras.

Banha Rosa com fama internacional


 

Resultado da matéria prima de altíssima qualidade a Banha Rosa galgou a preferência de todos com sua pasta branca refinada e cheirosa com destino certo, dar sabor aos alimentos em boa e reluzente panela de ferro.  Uma propaganda bem feita com um mote simples de boa comida ganhou o país inteiro.

Navio que abastecia o mundo


 

A produção semanal dos produtos do Frigorifico eram transportados para todo o Brasil através do navio da empresa.

A ala dos embutidos era capitaneada com capricho

 



Os embutidos do Frigorifico figuravam como as grandes delicias do Brasil e do mundo, havendo um verdadeiro exército de funcionários, motoristas, entregadores e pessoal da contabilidade que exercia suas tarefas com entusiasmo e precisão dando conta da grande produção que se espalhava de norte a sul do Brasil.

Os produtos eram diversificados

                                              



A reunião de excelente plantel de animais, tanto suínos quando bovinos conferiu a qualidade excepcional dos embutidos do Frigorifico e assim teve notório sucesso em todo mundo.



 

A Filial de Porto Alegre

 



A filial de Porto Alegre movimentava a cidade

Toda produção da semana era encaminhada para a Filial de Porto localizada na Rua Santo Antônio e dali era direcionada por rodovia, por rio e pelo navio da empresa..

Agradecimentos

  


                                                          

Tenho muitos agradecimentos a fazer quando decidi renovar este Blog que foi criado em 2012, atualizar dados históricos, sem deixar de relatar os acontecimentos da derrubada do prédio do Frigorifico Renner. A memória dos meus ancestrais figuram neste relato lúdico, humano e emocional em que pese todas as colaborações.

Esta iniciativa aconteceu em fevereiro de 2025, a partir de um contato da minha amiga de adolescência, Maria Clara Chassot, de Montenegro, através de uma Rede Social.  As memórias foram evoluindo, minha familia, amigos, conhecidos e moradores de Montenegro prestigiaram a iniciativa e a resolução de enriquecer o material - que foi instintivamente criado  anos atrás - cresceu e se consolidou. Uma singela homenagem a todos eles!

Maria Fernanda D'Almeida Renner e Julio Alfredo Renner

Dennis Renner Peter, Bisneto do Fundador Jacob Renner e Mestre em Design

Maria Clara Chassot, amiga de infância, incentivadora e divulgadora.

Regina Simões - amiga de infância em Montenegro e incentivadora.

Jorge Lewis Esswein, ex-funcionário de 1971 a 1973, leitor e incentivador.

Eloi Roque Dalcin, ex-funcionário de 1968 a 1973, leitor e incentivador.

Tina Griebeler, jornalista Montenegro/RS

Alexandre Quadros Pereira - Técnico em Informática- Capão Novo RS

Márcio Reinheimer e Janaina Azevedo Lopes / Autores do livro Memórias do Renner da Editora Ibiá em 2015.

Editora Ibiá

João Batista Teixeira e toda equipe do Jornal O Progresso de Montenegro.

Daiane Almeida de Azevedo historiadora e Diretora do Patrimônio Histórico e Cultura de Montenegro.

Angela Coutinho, acervo fotográfico.

Depoimentos - Maria Clara Chassot, Jorge Lewis Esswein e Eloi Roque Dalcin

Alguns montenegrinos ao se depararem com o Blog do Frigorifico Renner, dez anos depois de ocorrida a demolição definitiva, fizeram contato comigo e, gentil e amorosamente, deixaram seus depoimentos. Confiram !

Maria Clara Chassot



 “Minha adolescência ocorreu em Montenegro, uma cidade pequena com poucas indústrias o qual se destacava o Frigorifico Renner que empregava muitos montenegrinos. Vera Lucia fazia parte da minha turma até finalizarmos os estudos de base ocorrendo naturalmente a migração dos amigos para outras cidades, finalizando aquela etapa da vida. Reencontrei minha amiga de antigamente na internet ao me deparar com suas crônicas e acabei seguindo fielmente suas postagens. Fiz um contato pessoal e descobri que havia um Blog sobre o processo de demolição do Frigorifico no período de 2012 a 2015, ocasião da derrubada definitiva do Prédio. A narrativa é carregada de emoção e sentimento de honra."


Depoimento - Jorge Lewis Esswein ex-funcionário

 


Crédito "Canal Youtube Ralp Vida & Esperança"
@ralpvidaesperança
https://www.youtube.com/@RalpVidaEsperanca


 “Fiquei muito emocionado com a leitura do material que compõe este Blog que conta a trajetória de um dos maiores ícones que Montenegro já viu, o nosso Frigorifico Renner. Tive a honra de trabalhar por lá de 1971 a 1973, meu primeiro emprego com carteira assinada, aos 14 anos. Uma das minhas funções  no arquivo do escritório era de recolher os cartões ponto de todos os colaboradores, e desta forma, andava por todos os andares do prédio de onde nasceram grandes amizades. Uma moça muito querida da salsicharia me apelidou de Passarinho porque eu era muito magrinho, pernas compridas e finas e cabelos longos e crespos que saiam da touca branca. Até hoje sou conhecido por este apelido pelos antigos colegas da fábrica. Uma linda lembrança de tempos que não voltam mais.

Mas, a vida nos leva para caminhos que jamais poderíamos imaginar. Depois de tantos e tantos anos acabei conhecendo a Vera Lúcia pelo seu Blog onde consegui reviver todas as maravilhosas histórias que vivemos no alvorecer das nossas vidas. Deus é muito legal com a gente. Obrigado por me proporcionar tantas lindas lembranças e conhecer um pouquinho mais das origens da família Renner, que foi durante toda a minha vida uma grande inspiração.

Vou levar o Frigorífico Renner e meus amigos daquela época para sempre dentro do meu coração."


Depoimento - Eloi Roque Dalcin – ex-funcionário

 



“Trabalhei no Frigorifico Renner de 1968 a 1973, com apenas 16 anos e com muita responsabilidade. Passei pela Contabilidade, Área de Vendas, no setor de liberação de pedidos de enlatados para todo o Brasil, na sequência fazia a programação semanal da produção para atender os pedidos em carteira, emissão de notas fiscais para atendimento dos representantes e respectivo despacho para as transportadoras bem como emissão de notas fiscais de exportação de carne para abastecer o navio da Pescal. Sou muito grato pela oportunidade e aprendizado que teve grande relevância na minha vida profissional. Satisfeito por ver neste Blog uma parte da minha trajetória no Frigorifico.

Meu pai - Pé na terra mão no mar

 




Quando penso em meu pai lembro, em primeiro lugar, de um grande jornal e ele por detrás do mesmo me fazendo pensar como seria ficar tanto tempo entretido atrás daquele papel, preto e branco, áspero e que sujava as mãos. Depois, vinha o telefone preto em que se enfiava o dedo no buraquinho redondo com o número e se conversava com a telefonista, havendo depois, uma longa espera para que o dito cujo aparelho voltasse a tocar. Aí, sim, que sina a nossa assistindo sem nada entender horas e horas de conversas e até hoje tenho a impressão que ele comandava tudo por ali, o mundo e todos nós.  Ultimamente ando pensando que o meu amor por ler jornais e falar ao telefone – que coisa antiga - começou ali, do hábito dele se informar e se comunicar. Para fora, bem entendido. 

A feição dele era muito resoluta e séria, mas se amenizava quando nós os três irmãos nos escondíamos atrás das cortinas do quarto para ele nos encontrar, quando chegava de suas longas viagens. Ele também não ria muito em casa, hábito bem comum nos adultos daquela época, ou, talvez, porque não quisesse nos dar balda.  

Eu lembro também do cheiro dele que rescindia a charuto e em uma época houve o fumo de cachimbo que eu adorava. Gosto até hoje e levanto o nariz perseguindo o aroma quando círculo por algum lugar na cidade que recebe os adeptos. Os hábitos de casa também me vêm à mente como o ranger da porta do armário em que ficava o uísque preferido, o som seco do gelo ao cair no copo e depois o borbulhar da água mineral complementando o drink especial de época. O copo alto de cristal com desenhos primorosos e de cores suaves, eram perfeitos na degustação da bebida. Ele era um patriarca de bom gosto.  

A música clássica ecoava pela casa e quando ele ficou estafado acho que parte da cura veio através dos múltiplos vinis que lhe fizeram companhia em todos os momentos em que se recuperava. Eu ficava de longe, espiando e rezando para sentir novamente o cheiro dos seus tabacos maravilhosos e do buquê de suas bebidas pedindo a Deus que os jornais chegassem aos milhares e que o telefone nos ensurdecesse, só para vê-lo circular autoritário – quem diria – pela casa. Mesmo assim ficava eu em silêncio porque naquele tempo criança não falava. Calada eu já era, então, piorei.   

Ele era um homem poderoso e visionário com todos os seus talentos aperfeiçoados por vontade própria, um autodidata esforçado e com esta vontade férrea andou sempre para frente.  De todos os talentos dele eu não herdei nenhum, a não ser a teimosia.

Minha mãe Vera Renner

 



 

É sempre o inesperado quem me acolhe ao lembrar minha Mãe e quase sempre é algo que vejo em mim, o que não é difícil uma vez que estou envelhecendo e meus traços vão tomando um contorno muito semelhante a ela como uma condição atávica. 

Ao andar pela casa vou tropeçando em quase tudo que lembra a casa dela porque alguns objetos fizeram parte da minha vida toda. Além disso o jeito de arrumar é muito parecido. Quase não possuo móveis modernos, os meus enfeites são as porcelanas e objetos que vieram desde a casa em que nasci passando pelas doações de tia e avós. A minha arrumação fica quase que sendo um santuário de lembranças e assim eu vou vivendo sempre de olho no que é belo, que tem tradição e me conforta, comprovando que eu não preciso de nada. 

Na aparência acontece a mesma coisa. Quando eu visto uma roupa colorida – que não é minha preferência – fica claro que fui empurrada para aquele figurino como se houvesse uma força maior. A mesma coisa acontece ao me olhar no espelho e ver em mim as rugas dela, o cabelo escasseando nas têmporas e branqueando em torno do rosto como assim foi em minha Mãe. Na manicure as mãos que se estendem na vaidade são distintas na cor do esmalte, e então começo a perceber nossas diferenças. 

Ao contrario de mim ela era contida, não tinha o riso fácil e falava baixo, acho que era porque o seu interior de artista brilhante puxava o seu melhor para dentro, guardando elementos para poder dispô-los em suas artes manuais. Hoje eu sei que suas gargalhadas migraram no entrelaçamento das tapeçarias que tecia constantemente deixando um rastro dos seus sentimentos alegres e coloridos pendurado na parede. 

O brilho do seu olhar estava refletido nas mil miçangas com que bordou ponto a ponto meus vestidos de baile e suas alegrias ficaram enfurnadas nas longas luvas de cetim que compunha o traje que escondia meu braço magrelo e sem traquejo social, porém, minha Mãe possuía glamour nato que assim me era conferido. Ainda escuto o rufar da maquina de costura que ela acelerava com os pés parecendo um trem antigo que ruidosamente lhe fazia companhia. 

Não tenho o dom que minha Mãe tinha para a costura e o bordado mas gosto de pensar que a minha intimidade com a escrita e meu despudor em demonstrar o que me vai dentro da alma costurando histórias através das letras vem deste talento dela.

Minhas avós, Araci Leite Renner e Edwiges Ruschel

 Araci Leite Renner


Minhas avós tinham convivência bem próxima comigo, meus irmãos e meus primos o que deixava a vida movimentada porque em sendo as duas a conviver, as semelhanças e diferenças se misturavam sem nem a gente perceber. Na verdade o amor e o respeito por elas se adiantava em tudo o que a gente quisesse ousar fazer ou dizer. As casas eram distantes e por isso mesmo sempre uma aventura deliciosa se lançar à visita daquela que ficava mais longe.

 A minha avó paterna era moderna, altiva e elegante. Dominava o clã com maestria. Morávamos em casas lado a lado com portões dos jardins que davam acesso aos meus primos. Quando lembro destes jardins impecáveis parece-me que vivi um conto de fadas, tal o vai e vem que durava o dia inteiro, nossa grande ocupação afora os estudos. Em cada casa havia uma história e ritos diferentes porem semelhantes. Da minha sala de estudos eu tinha a janela que me dava a oportunidade de ver minha avó me chamar para o café da tarde o que fazia de um salto. A cozinha, grande, com decoração absolutamente combinada de móveis, utensílios de cozinha e que tais me deixavam de olho arregalado. Afora isso o interior da casa era de prender a respiração e me deixava de certo modo com receio de tropeçar e esbarrar em algo e assim eu evitava circular por lá.

Hedwiges Ruschel


A minha vó materna era calada e suave, simples em tudo que lhe dizia respeito, sua casa, para mim, tinha um ar de história a ser contada, de segredos não revelados, de móveis de ancestrais, quiçá. Ao chegar lá, quase sempre sozinha a encontrava de enxada na mão rescendendo a tanino revolvendo seu rustico jardim e meu sentido era de curiosidade para me aventurar por um porão que rescendia a umidade e dava calafrios, uma taquareira que me assombrava pela possibilidade de ali existirem cobras. Lembro que eu amava andar por ali, pé ante pé com o coração na boca de medo, um medo infantil delicioso, pois havia um misto de verdade e de ilusão. A proposito da comida, que criança sempre tem de se deparar, principalmente por seus avós, foi ali, criança pequena que conheci o “à la minuta” devidamente embalado pelas ondas de um radio ligado na Rádio Farroupilha. 

Amo pensar que eu tenho delas as duas partes dentro de mim. Estão separadas e aparecem nitidamente no meu dia a dia, seja na maneira de se comportar, de comer ou da arrumação da casa, tendo o privilégio de colocar ao meu redor objetos que pertenceram às duas.


Assim chega o Prédio

 

 


                            Fábula “A Menina, o Prédio e o Rio”

               Blog do Frigorifico Renner – Uma História uma Griffe

                           http://frigorificorenner.blogspot.com

                                        Por Vera Lucia Renner

 As tratativas para demolição do icônico prédio do Frigorifico situado no Porto das Laranjeiras a beira do Rio Caí em Montenegro iniciaram a partir da falência da fábrica em 1980. Após este  periodo houveram vários entraves até chegar o Ano de 2012, início da discussão até a implosão definitiva em 2015.

Naquele momento senti a necessidade de escrever sobre o assunto e criei uma coletânea de textos que constam no Blog http://frigorificorenner.blogspot.com  que ora se apresenta.

Os textos foram costurados baseado na trilogia “A menina, o Prédio e o Rio” que sequenciou a trajetória da destruição do imponente prédio até virar pó. São os três personagens que contam o sofrimento de uma cidade ao ver aqueles tijolos que fizeram parte importante das famílias irem abaixo. Acompanhem a evolução das peripécias dos três personagens que dão vida ao relato lúdico, emocionante e verídico, pintado com as cores do imaginário.


sexta-feira, 30 de maio de 2025

O apito

 


“.....Tanto a entrada de serviço do Renner quanto a saída eram sinalizados por um longo e pungente apito ouvido a longa distância. Os operários invadiam as ruas uniformizados de branco dos pés à cabeça se dirigindo alegremente ao local de trabalho da cidade...”

*********** 

O apito

A cidade era banhada por um rio caudaloso, de saudável cor vermelha barrenta, ladeado por uma várzea exuberante de mata nativa. Por ali navegavam as “chatas” e os vapores com ruídos de progresso que se misturavam à vida saudável das águas de antigamente. 

Foi nessa terra de outrora que às margens deste rio se instalou uma das maiores indústrias dos últimos tempos, tendo sua população centrada a trabalhar naquele local e tê-la como referência de vida e amor a quem lhe dava subsistência. 

E assim se tocava a rotina onde as mudanças de turno da cidade eram ditadas pelo apito de profunda sonoridade que chegava aos ouvidos de todos da região, embalado em ondas, avisando aos trabalhadores da fábrica, e ao lugar, que estava na hora de começar a jornada, ou fazer seu almoço rodeado por familiares em volta da mesa e, por fim, o desejado “soltar” na tardinha.   

No momento em que o sol se deita sobre o rio, glorioso, tinge com vários matizes o prédio da fábrica imponente com seus tijolos à vista, deixando em furta-cor cada pedra. 

A cada turno apitado, a rua principal era invadida pelos ilustres coadjuvantes desta história, que rumavam aos seus lares em plena algazarra de final de dia inundando as ruas com seus uniformes brancos, sorriso aberto e já na espera. 

Uma cidade avançada em anos e já cinzenta recebia aquela massa branca que se refletia em luz. Ao subir naquele brete focando minha visão nas alturas do seu término, estonteava e caía para trás, rindo. Sabe como é, criança se impressiona e não tem muito equilíbrio, se derrubando sozinha de susto, de tonteira ou só para brincar.

Não era o caso. E larguei a pensar como seria subir passo a passo, como os bois e porcos, aquela ponte para o sempre, para o progresso, para a evolução, para a sobrevivência, para alimentar, para transformar. E aturdia.

Não precisei da imaginação para verificar o destino dos animais que subiam o brete parecendo que berravam alegremente uns com os outros, inocentes, se ralando em força dobrada para ir a algum lugar que lhes indicava o apontador. Olhar e andar em frente, era a ordem. Berrar, urgia. Uma marretada certeira e o bicho se vai. Tempos antigos.

Vai daí que se imagina o fim, mas é apenas o começo.  Destras mãos iniciam o trabalho de todo dia com a abertura de uma tarefa que irá se desencadear como uma rima do mais alto andar, o abate,  até o mais térreo. O resultado, a chegada necessária na mesa de todos.

Desenrolando um fio de alta performance, os participantes vão demonstrando sua capacidade de criação e transformação da matéria prima em produto. Os operários com suas cabeças muito bem apanhadas em alvos gorros brancos, raciocinam e lideram seus gestos precisos de destrinche, separação, mistura e acondicionamento do que lhes foi proposto a realizar, finalizando na expedição. Tudo empacotado.


A carcaça em sofrimento

 


A luz interna artificial tratava de dar vida a faina diária distribuída entre muitos que se entregavam ao trabalho dando o seu melhor, fizesse chuva ou sol. Da rua ninguém enxergava as paredes rigorosamente alvas que provavam que naquele dia se iniciava, mais uma vez, a corrente de produção que levaria ao Brasil gostosuras. 

De cima para baixo havia quem fizesse o comando das tarefas parecer uma orquestra muito bem afinada, com um ritmo composto de tripa, de ossos, de vísceras e muita banha. A luz fluorescente interna entrava forte e angulosa e não havia um só canto em que não houvesse produção forte que consistia na transformação de um produto em outro. 

Bem ao lado o plantel da burocracia, trabalhando perto do chão mas de olho no alto, nas estatísticas, na qualidade, na distribuição, no entra e sai de caminhões, no carrega e descarrega, na fiscalização. No borbulhar do passado surge o grande salão organizado com velhas mesas de escritório tão presente que posso lhes sentir o cheiro, das fisionomias posso visualizar sorrisos e escutar o farfalhar de papéis e o tic-tac ininterrupto das máquinas de escrever e assim, um dia foi calado quem tanto barulho fazia. 

Aos poucos o descaso foi destruindo a vida do gigantesco edifício, deixando suas paredes de tijolo vermelho, outrora voluntariosas e protegidas,  se rasgarem em  céu aberto  mostrando sem pudor suas entranhas. Uma carcaça em silencioso sofrimento.

O som dos ventos

 


Ali estava ele, soberbo, resistindo todos estes anos ao descaso, velho desfamiliado por decreto desprovido de utilidade. Logo quando se chega na idade da sabedoria em que então muito se pode dar aos que o rodeiam. O patrimônio de famílias e de cidades conta a história de seus filhos e não se renega a quem se pertence, diz ele entre tijolos, mas ninguém mais o escuta porque o seu som se calou há muito.

Em suas ruínas com escaras a céu aberto posso ouvir o som dos ventos perpassando por entre os vãos, cantando a música da história jogando ao rio as partituras, voltando a se enfunar na escangalhada fachada deixando as vigas de concreto e ferro entrincheirados na sustentação ainda firmes, atentas àquele som. Outrora o barulho advinha das tarefas, do vigor da fábrica em pleno funcionamento, dando vida e sustento as muitas famílias do entorno.

Na memória de alguns a lembrança do som rasgando a cidade anunciando pela corneta do boiadeiro o tropel ensandecido e barulhento que levava até as janelas da escola as crianças que se deliciavam com a imagem do faroeste ao vivo. E delas vinha a expressão: lá se vão pro campo dos “rêna”!!!!!

Neste dia frio e sombrio algo aconteceu e o abraço veio na medida certa, como uma onda de sangue novo nas veias, como um bafão de esperança, como a luz do lembrar. O imponente prédio largou a pensar que a morte deve ser assim, uma quenturinha na carcaça e se vai para sempre.

O Rio rasga a barranca

 


A estrutura espetacular sempre foi determinante para todos e sempre os assuntos na cidade faziam tal figuração na mente do povo, que até hoje tem poder de emoção e de engajamento onde as lembranças seguem seu ritual nostálgico, aguçando a história, ameaçando dar um sentido muito maior ao todo.

A maior fuzarca era aquele lugar ao receber a multidão branca caminhando pela rua Ramiro Barcelos. Todo dia o lufa-lufa se espraiava para além dos domínios da fábrica marcando com vivacidade as cercanias onde também uma vida de bons frutos se acomodava, pródiga na criação de animais, plantação de frutas, verduras, alimentando os dali  e os familiares.  Tudo com simplicidade de quem pensa que não tem como escapar daquela boa sorte.

E não somente o trabalho a fábrica provia aos seus. As reuniões esportivas faziam parte do pedaço de terra ao lado, cuidado com amor e dedicação de todos, revelando atletas, fazendo com que a arte de jogar bola fosse encarada como uma forma de unir mulheres, crianças, amigos e muito mais, em torno da alegria. Sol a pino, as ponteiras da chuteira na canela do adversário, o soco na pleura e o campo fervilhava de simpatia, esquentando a torcida e atochando o momento para sempre na lembrança de cada um, perpassando sem dúvida, aos seus.

O rio, caudaloso, se aconchegava à área ofertando seu leito com generosidade às chatas abarrotadas que afundavam até a beirada,  mas ele as conduzia feliz, absorto na tarefa e encantado pelo marulhar de suas ondas. De humores, o rio enciumado, volta e meia inundava toda a área, afundando na lama toda a pujança, com sede daquela alegria e movimento. Ao ouvir o som da picareta da lei, indignado, rasgou sua barranca e recolheu a fábrica para dentro de si.

A banha

  


O imaginário nunca se faz tão forte e soberbo quanto a realidade e por mais que se queira vislumbrar como foi, em tempos modernos, se torna quase impossível. 

Rodando os calcanhares encalochados em poderosas botas brancas, se engalfinhavam os fazedores de banha pelo piso encharcado, só não escorregando porque não era hora. Algum tempo depois Julio Alfredo adotou os famosos tamancos tipo holandês, brancos, e lá se ia o macharedo batendo salto alto no ir e vir da  fabricação da banha ROSA que tinha seu destino selado:  panela de ferro. Novidadeira, a fábrica roncava uníssona e alardeava para todo o povo sua propaganda, alcançando, naquele tempo, todo o país.

Em primeira mão, a pasta branca refinada era o resultado dos esforços de muitos que desde a obtenção da matéria prima se açodavam para compor o mistério que naquela época não depositava seu resultado na cintura de ninguém. Ela existia unicamente para dar sabor à comida, para passar no pão caseiro, para lembrar que desde sempre o homem utilizou a gordura animal para cozinhar sua caça. Era o paladar que ditava os rumos daqueles tijolos muito bem embalados e com uma propaganda bem retrô dando água na boca de quem passava pelas prateleiras frigorificadas dos mercados. A banha ficou fora de moda e apontada como vilã, mas, não deveríamos esquecer do seu passado saboroso e abençoado. Relegar preciosidades custa muito.

O elevador - O maquinário não perdeu sua vida

 


Aquele elevador não se deixou abater nem desmarcar seu território e segue ileso, sendo também sustentado pelas lembranças, que não são poucas e que o faz todo dia espiar o entorno e receber as luzes do dia com o reflexo do movimento do rio.

Na memória, muito barulho, risadas constantes e a gritaria dos operários que estavam começando o dia, intercalando os andares conforme fosse a atividade ou descendo no final, trazendo atrás de si a água lavando o que foi deixado para trás.

Na imaginação, todo dia é recolhido para seu interior os mugidos e grunhidos que  se ouvia entre um e outro andar, misturado às ordens dos capatazes e a interlocução dos andantes.

Sem o som de antigamente o silêncio é acompanhado apenas dos caramujos que andarilham por ali, as traças sorrateiras e as teias de aranha que ali estão contando a história e fazendo companhia ao velho elevador.

A vida segue ali intensa porque o maquinário não perdeu sua vida e continua subindo e descendo no olhar dos passantes, se distraindo na contagem das estrelas, assoviando ao vento para o telhado descarnado de proteção.

Na roda da vida ele poderá vir abaixo como um herói remanescente de uma história  contada de boca em boca e que nenhuma ferramenta ou bomba de destruição poderá calar.

O ciúme e o Rio - A história irá contar

 


 

Espiam-se há muitas décadas aqueles dois, seguindo o curso da vida lado a lado, parecendo um casal que nasceu para ficar junto até a eternidade. Nas laterais a barranca do Rio, fértil ainda, apesar do tempo passando e do progresso que insiste em sabotar a margem, não se dá conta que mata quem lhe dá a vida. A conta corrente do descaso com Sede no Universo, está bem gorda.  

Birrento, o Rio movimenta suas águas em leito manhoso e muito dengoso recolhe todos os olhares e causos inconfessos contados às suas margens, porque todos sabem que a barrenta  leva adiante, e em segredo, os sentimentos jogados por quem se aproxima. Um conluio da cidade com seu caudal afetuoso, porém muito ciumento.

Em sua companhia, lado a lado, o esqueleto da fábrica se reflete cheio de cores, sempre que tem oportunidade. Agora esguio, por força das circunstâncias, esquelético e mesmo assustador,  não se constrange em fornecer aos seus,  espetáculos de luz e cor quando recebe os fulgores do sol,  da lua e do arco-íris em dias de chuva. Não deixa por menos quando todas as noites escancara suas entranhas destroçadas e enferrujadas às luzes do cais e não perde a oportunidade de demonstrar sua ligação e fidelidade com a beirada, sua cúmplice.

A barranca e o Prédio conversam em linguagem secreta e criam o elo perfeito entre si, composto das firulas que se pode ver a olho nu no pedaço de terra que une a ribanceira ao prédio. Aqueles dois se divertem ameaçando a integridade de ambos em um jogo desafiador que meneia entre a teimosia e a coragem.

A antiga fábrica imagina como irá acontecer sua arrebentação com bombas planejadas, fazendo desabar seus restos um sobre o outro, levantando uma poeira multicolorida, espalhando pedaços de ferro retorcidos que, heroicos, não deixaram desabar sozinho o que restou do arrombamento de suas paredes. A história que vira poeira em segundos. Os dois talvez planejem cair juntos, se confundindo em uma única massa de água e terra, abrindo uma chaga na cidade.

Caminhando pelos corredores

 


Já se passou quase tudo de barulho, das ventas dos dias, das águas demais ou de menos e também a calmaria se alojou no entorno do meu corpo, que segue de pé, como se não houvesse amanhã.

Dei uma espiada bem longa hoje na barranca do Rio, baixei a guarda para espiar as calçadas em frente e não vi grande movimentação. Como sou alto, dá para subir no último andar e espiar de muito longe a morada dos arautos de todas as tribos. Tudo quieto.

Então, resolvi me ensimesmar, olhar para dentro, caminhar pelos corredores que ainda estão mornos do sol de verão, chutar uma ou outra carcaça podre que por ventura tenham se alojado no meu bucho e eu não percebi. Sou grande, velho, e como tal, teimoso. As passadas vão ficando mais pesadas, porém, o vigor das lembranças renova o meu fôlego e tento buscar dentro do meu corpo, uma construção secular vilipendiada e destruída pelo descaso e pela ignorância, a verdade sobre quem fui.

Parei para descansar e sentei-me numa banqueta improvisada de restos de tijolos que acredito, os larápios esqueceram-se de carregar. A vista dali rasgava a cidade e por um momento eu vi aquela rua principal coalhada de uma população que mais parecia um exército de outro mundo, pois todos estavam de branco, da cabeça aos pés. Apertei o olho para ver se eu identificava algum dos meus guardiões de quando eu estava vivo, mas era muita gente.

Levantei-me e segui o passeio arrastando mais os pés no chão esburacado e, deste jeito, sem querer, fui produzindo um som, inicialmente um longo apito, e na sua continuação, os acordes de uma vida industrial produtiva, porém morta. Nesta hora o meu amigo Rio me jogou uma lufada de água poluída na cara e se enfarpelou em ondas. Ele sempre faz isso quando eu fico melancólico.

Esqueleto a mostra

 


Ando animadão, mesmo com o frio e a chuva que me fustigam, mas podem acreditar, não me castiga mais que o descaso, mas este, também vou deixar de lado, agora que minha autoestima está mais fortalecida. A companhia da barranca e do meu Amigo Rio, que anda engordando as margens com tanta água, também favorece o meu bom humor e a nossa conversa diária a respeito da vida e de seus imprevistos nos une e nos dá força. Eu, para não cair antes da hora e o outro que não pereça com suas águas envenenadas pelo progresso.  

O esqueleto colocado à mostra também não me envergonha mais, porque em dias de hoje, ser magrão, quase translúcido, é moderno. É só ver os atletas de final de semana resfolegando na Beira do Rio em busca da magreza. Eu já estou em forma sem sair do lugar. Anos atrás fizeram uma bela lipoaspiração que levou a minha massa muscular feita de tijolos e o cimento, minha gordura nas dobrinhas. Sem falar na lobotomia, é claro, que deixou sequelas mais profundas, como a desativação da fábrica e assim fiquei morto-vivo.

Em consequência disso, hoje, eu sinto como se o tempo houvesse parado e eu não morro de inanição porque tenho amor, gente e palavras ao meu redor, mesmo estando tão velho. Idosos e crianças vem me acenar quase todos os dias e a memória de quem fui está sendo passada de pai para filho assim como velhas fotos já amareladas são trocadas de caixa permanecendo a história. Além de todo esse elo com a cidade existe a teia bordada pelas letras que  se sucedem uma à outra, cerimoniosamente, me elevando à vida eterna.

Embutidos produtos da esperança

 


Nariz empinado fico ainda buscando na lembrança os cheiros das fábricas de meu pai vindo em primeiro lugar o mais forte, a fábrica de peixe, a que ele se referia como “cheiro de trabalho”, alcunha razoável para o fedorão que assolava a cidade de Rio Grande. Eu, adorava, pois o ar tinha um nome. Era o cheiro da faina e do labor nos mares. E, claro, a cara do meu pai. 

Em franca digressão, volto aqui porque não é deste cheiro que eu quero me referir e sim da porcalhada cor de rosa que subia as rampas do Frigo cumprindo o seu destino em algazarra uníssona.

Novinha ainda eu andava pelos andares da fábrica observando a feitura das gostosuras percebendo que de tudo se aproveitava do animal, inclusive todo o seu bucho e pontas do corpo.

A formação da massa que iria engrossar os produtos mais diversos passava pela cozinha da fábrica, comandada pelo meu pai, que adicionava às partes compostas seus temperos, até ficar de um sabor que fizesse jus à marca.

No processo se acumulava dentro da tripa, esfarelados e picados, um anel do rabo enrolado do porco, a ponta da orelha, o restolho de focinho, uma quilha da pata, uma fatia de graxa e uma raspa de couro. Tudo entubado na tripa original do bicho.

Estas lembranças e muitos cheiros e sabores ainda vagam no imaginário dos Montenegrinos que viveram esta época. E muito mais na daqueles que se defrontam, todo dia, com o edifício teimoso ainda de pé.

Agora se formou uma longa tripa composta de esperança, atochada de ingredientes como a saudade, o respeito, suspiros e relatos montando a história. Viscosa por estar hidratada de lágrimas ela se enrosca por entre vigas.

Lembranças em perspectiva

 


Grandão, calou-se faz muito mas foi tal o berreiro em seu entorno que seus vãos deram uma balançada, a passarada se alvorotou e até as pedras já gastas do caminho rolaram entre si com mais energia. O rio resolveu se revoltar e ameaçou de fazer sucumbir a terra em seu entorno, já bem fragilizada.

Não para por aí o barulho, uma vez que muitas lembranças foram desenterradas e as histórias chegaram ao momento presente animando a torcida. No imaginário de muitos o apito voltou a tocar delineando as normas do dia e muitos se vestiram de branco e foram às ruas com sorriso igual. O tempo parou. 

Os trilhos vieram fazer parte do atalho dos operários e desta vez as pessoas que lá atrás eram crianças descobriram que quem assombrava os velhos trilhos do trem não eram fantasmas, mas sim a galera trabalhadora da fábrica que sorrateiramente, e com muita pressa, se esgueirava pelo caminho menos convencional para chegar logo às suas casas. Histórias criadas e para sempre acreditadas.

A Kombi voltou a circular nas “vendas” de esquina fazendo a entrega  e abastecendo a cidade, esquentando a conversa, animando as rodas preguiçosas daquelas manhãs de sol ou de chuva, não importava. O que valia a pena era a ação sistemática e a rotina de cada semana que dava vida e saúde mental aos  coadjuvantes da história. 

Crianças voltaram a ser guiadas pelas mãos dos seus pais para visita à fábrica e de olhos esbugalhados seguiam mudas, mas muito atentas, às explicações e ensinamentos que emanavam daquele lugar. Tudo sólido, correndo frente ao rio soberano e forte. Tudo pode ser, com outras cores.

Julio Renner: Um pouco da história do Frigorifico Renner

  Autor: Vera Lucia Renner Ano de 2025 O ano era de 1896 no Vale do Caí quando meu bisavô descendente de alemães,  Jacob Renner, fundou ...