Nariz empinado fico ainda buscando na lembrança os cheiros das fábricas de meu pai vindo em primeiro lugar o mais forte, a fábrica de peixe, a que ele se referia como “cheiro de trabalho”, alcunha razoável para o fedorão que assolava a cidade de Rio Grande. Eu, adorava, pois o ar tinha um nome. Era o cheiro da faina e do labor nos mares. E, claro, a cara do meu pai.
Em franca digressão, volto aqui porque não é deste
cheiro que eu quero me referir e sim da porcalhada cor de rosa que subia as
rampas do Frigo cumprindo o seu destino em algazarra uníssona.
Novinha ainda eu andava pelos andares da fábrica
observando a feitura das gostosuras percebendo que de tudo se aproveitava do
animal, inclusive todo o seu bucho e pontas do corpo.
A formação da massa que iria
engrossar os produtos mais diversos passava pela cozinha da fábrica, comandada
pelo meu pai, que adicionava às partes compostas seus temperos, até ficar de um
sabor que fizesse jus à marca.
No processo se acumulava dentro da tripa,
esfarelados e picados, um anel do rabo enrolado do porco, a ponta da orelha, o
restolho de focinho, uma quilha da pata, uma fatia de graxa e uma raspa de
couro. Tudo entubado na tripa original do bicho.
Estas lembranças e muitos cheiros e sabores ainda
vagam no imaginário dos Montenegrinos que viveram esta época. E muito mais na
daqueles que se defrontam, todo dia, com o edifício teimoso ainda de pé.
Agora
se formou uma longa tripa composta de esperança, atochada de ingredientes como
a saudade, o respeito, suspiros e relatos montando a história. Viscosa por
estar hidratada de lágrimas ela se enrosca por entre vigas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário