terça-feira, 27 de maio de 2025

As ruínas - um desapego genuíuno

 


Depois do bafão e do ruído que os tijolos - grandes traquinas – resolveram aprontar se desabando por iniciativa própria ruínas abaixo, os três personagens fabulosos resolveram fazer uma reunião. Então, sentaram bem na quina do desabo,  A Menina, o Prédio e o Rio, O Rio e A Menina que, sendo a única letrada por ali, resolveu pautar a conversa em três palavras que cada um deles iria dissecar, uma vez que a ocasião urge em verborreia.

Então O Prédio, que é o sujeito de todas as frases e vive frequentando veículos escritos, online e também todas as bocas, sujas ou não, resolveu dissertar sobre a palavra representação. Ele se sente atingido por ela cada vez que se refere ao seu destino, destino esse que já se cumpriu. Ora veja. Porém, apesar de tudo que representou para a cidade e que há muito não o faz, sua alma se tornou física, para seu desgosto, porque em ruínas isso não é elegante na paisagem e no risco. Se ele pudesse se despedaçaria em pó se representando apenas na memória carinhosa dos moradores, dos passantes que o apontam e contam sua história aos filhos, nas sombras do rio, nas bibliotecas da região, no arquivo morto dos jornais, nos acervos particulares dos filhos da terra, nas fotografias e no coração da Família. 

A Menina arregala os olhos frente à tão sincera e verdadeira assertiva, mas ela, como sendo filha do Prédio, resolve falar um pouco sobre sonhos, afinal, eles fazem parte da vida e se incluiu com feroz determinação na alma da cidade que então carregou a utopia anos afora, não dando trela para quem vinha jogar a realidade na cara, dando corda para as bandeiras políticas, dando vazão ao desespero da perda no corte do céu e no reflexo do rio. Sonhos fazem a imaginação volatizar situações e chegar a destinos impossíveis de se realizar ainda mais quando apenas o coração o protagoniza. O desejo possuía um timbre espetacular, pena que inócuo. 

O Rio ficou feliz com os dois discursos e entrou de sola - ou de leito em punho - para dizer, mais uma vez, o óbvio. Desapegar é a sua palavra porque é exatamente o que ele faz em sua vida inteira. Afinal seu curso entrega tudo em suas correntezas sem ficar com nada. Nada mesmo. Ou, quem sabe, fica com a gratidão. Antigamente, com o agradecimento de quem buscava o alimento em suas águas, com as risadas de quem se banhava em si e com o orgulho do progresso de quem utilizava sua bacia para fazer negócio. O Rio achou que talvez fosse hora de as ruínas obterem um desapego genuíno, sem promessas e sem romantismo.

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