sexta-feira, 30 de maio de 2025

A carcaça em sofrimento

 


A luz interna artificial tratava de dar vida a faina diária distribuída entre muitos que se entregavam ao trabalho dando o seu melhor, fizesse chuva ou sol. Da rua ninguém enxergava as paredes rigorosamente alvas que provavam que naquele dia se iniciava, mais uma vez, a corrente de produção que levaria ao Brasil gostosuras. 

De cima para baixo havia quem fizesse o comando das tarefas parecer uma orquestra muito bem afinada, com um ritmo composto de tripa, de ossos, de vísceras e muita banha. A luz fluorescente interna entrava forte e angulosa e não havia um só canto em que não houvesse produção forte que consistia na transformação de um produto em outro. 

Bem ao lado o plantel da burocracia, trabalhando perto do chão mas de olho no alto, nas estatísticas, na qualidade, na distribuição, no entra e sai de caminhões, no carrega e descarrega, na fiscalização. No borbulhar do passado surge o grande salão organizado com velhas mesas de escritório tão presente que posso lhes sentir o cheiro, das fisionomias posso visualizar sorrisos e escutar o farfalhar de papéis e o tic-tac ininterrupto das máquinas de escrever e assim, um dia foi calado quem tanto barulho fazia. 

Aos poucos o descaso foi destruindo a vida do gigantesco edifício, deixando suas paredes de tijolo vermelho, outrora voluntariosas e protegidas,  se rasgarem em  céu aberto  mostrando sem pudor suas entranhas. Uma carcaça em silencioso sofrimento.

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